Bitcoin diante de uma crise sem precedentes, segundo a Glassnode

A euforia dos picos de fevereiro se evaporou. O bitcoin, após flertar com 109.000 dólares, oscila hoje em torno de 82.000 dólares, revelando uma realidade mais complexa do que parece. Segundo o último relatório da Glassnode, assinado pelos pesquisadores Cryptovizart e Ukuria OC, o mercado enfrenta uma crise de liquidez sem precedentes, acompanhada de uma crescente fratura entre os investidores. Um quadro contrastante que provoca a questão: o bitcoin está em um ponto crítico ou simplesmente em fase de consolidação?  

O bitcoin frente à fome de liquidez

O bitcoin atravessa um período de escassez financeira. O Realized Cap, indicador chave que mede os capitais realmente investidos, só avança 0,67% ao mês. 

Uma estagnação que trai a ausência de fluxos de capital fresco, essenciais para sustentar os preços. As trocas on-chain e os mercados derivativos refletem essa asfixia: as entradas nas plataformas caíram 54% desde o final de fevereiro, enquanto o “Hot Supply” — esses bitcoins detidos por menos de uma semana, símbolo de especulação frenética — derreteu pela metade, representando apenas 2,8% da oferta circulante.

O interesse aberto sobre os contratos futuros caiu 35%, sinal de uma retirada das estratégias de hedge e arbitragem.

As instituições, em particular, estão desfazendo suas posições “cash and carry” — combinando ETF spot e shorts em contratos futuros — provocando fechamentos massivos (378 milhões de dólares no CME) e saídas de ETF. “O desmantelamento dessas operações acentua a pressão sobre os preços”, sublinha a Glassnode.

As opções contam a mesma história: os prêmios dos puts sobem, enquanto o Delta Skew (25) confirma que as proteções de baixa são preferidas pelos investidores. Os traders institucionais, em particular, parecem se barricar, antecipando uma volatilidade persistente.  

Investidores: um cisma entre náufragos e sobreviventes  

A correção atual do bitcoin está cavando um fosso entre duas categorias de atores. Os detentores de curto prazo (STH), pegos na tormenta, veem suas perdas não realizadas alcançarem níveis cíclicos recordes: 7 bilhões de dólares desde fevereiro.

Um número alarmante, mas que ainda é inferior ao das capitulações de 2021-2022. “Esses investidores estão sob intensa pressão psicológica, oscilando entre esperança e pânico,” analisam Cryptovizart e Ukuria OC.

Em contrapartida, os detentores de longo prazo (LTH) estão jogando o tempo a seu favor. Sua atividade de venda desacelera, embora alguns tenham aproveitado a oportunidade para garantir lucros em torno de 80.000 dólares. 

“Sua retirada parcial do mercado reflete uma estratégia defensiva, mas não uma fuga”, especifica o relatório. Com 40% da riqueza total do bitcoin em suas mãos, os LTH estão sentados sobre uma espada de Dâmocles: uma revenda massiva poderia inundar o mercado.

Essa dualidade desenha um cenário paradoxal. De um lado, os STH, atolados em perdas históricas, personificam a fragilidade do mercado de varejo. Do outro, os LTH, guardiões silenciosos, parecem voltar a uma lógica de acumulação paciente. “Sua inércia relativa atua como estabilizador, limitando as vendas em pânico,” nota a Glassnode.

O bitcoin navega em uma zona cinza, dividido entre a prudência institucional e o desespero dos pequenos investidores. A liquidez atônica e a alta volatilidade podem persistir enquanto os fluxos de entrada permanecerem tímidos. No entanto, uma esperança persiste: se os ETFs institucionais conseguirem compensar as saídas, a rede poderá recuperar um equilíbrio.